(ENGLISH VERSION BELOW)
KUBLA KHAN *
Ciclo Estados–Gerais
28.05 - 20.06.2009
António Bolota (AO 1962)
Ryan Foerster (CA 1983)
Invernomuto (2003/ IT 1982, 1983)
Ana Manso (PT 1984)
+
Sister Corita Kent (US 1918-1986)
*Kubla Khan ou “A Visão num Sonho” é um poema de Samuel Coleridge, que toma o nome do implacável imperador Chinês, por nele mencionar alguns dos seus episódios de vida. O poema escrito a jacto num sonho induzido por ópio, teria ficado para sempre inacabado por intromissão do Homem de Porlock, a figura literária do interruptor indesejado.
O conceito de energia aplicado ao contexto da exposição que se apresenta, oscila entre um elemento ponderável, físico-químico, e algo que parece fugir ao terreno do classificável (positivo) pela extensão intuitiva e/ ou metafórica que pode incluir.
Na viragem para o séc. XIX, Luigi Galvani iniciou uma série de experiências de animação de corpos animais e humanos mortos através do uso de corrente eléctrica, chegando ao conceito de energia animal: algo que anima os corpos; algo invisível mas quantificável; terreno; desligado de qualquer força exterior ao homem; em suma, nada que operasse para além do entendimento. Estas experiências de Galvanismo, além do seu impacto no imaginário literário do séc. XIX, dos quais se poderá referir o Frankenstein de Mary Shelley, podem adquirir um carácter exemplar, partindo para uma extrapolação que se pode ramificar numa abertura de sentido para dois lados: na percepção da comunidade humana como detentora de um capital energético humano, e numa simbolização da vontade.
Fará especial sentido falar de energia no contexto deste ciclo de programação. Ainda que autonomizado apenas neste último momento expositivo, a sua presença percorre todos os outros acontecimentos. Ao pensar sobre questões de produção, pensamento, acção; a energia, como uma vibração invisível, funciona como um motor de dinâmicas sociais, pensamento livre, revoluções. O seu uso metafórico consolidou-se quase como emblema da arte ocidental desde o Modernismo, exemplificando um ideal de acção, activismo, vontade.
Neste sentido, uma tradição aparentemente trivial pode servir de fio condutor a uma série de exemplos. Uma variante gastronómica de um prato absolutamente banal adquire uma possibilidade demonstrativa: a confecção do cozido das furnas nas ilhas açorianas. Ao ser cozinhado pelo calor da terra em zonas de especial actividade geotérmica, o quotidiano da comunidade evoca um enraizamento no lugar tectónico onde se está.
Tanto as tradições de uma comunidade servem de catalisador a uma série de eventos que nas suas trocas e sinergias são detentores de uma energia motriz, como a energia de um lugar na Terra provoca entres os seus habitantes, numa comunhão com o mundo, a produção de ideias e artefactos absolutamente específicos.
O colectivo italiano Invernomuto (IT, desde 2003) apresenta na exposição 'Whalesland', um trabalho que parte da subcultura black metal norueguesa, e que conta com a colaboração dos músicos John Duncan e OvO na banda-sonora. A conjugação de um filme “documental” com slides de paisagem genericamente associada à Escandinávia, mas na realidade captados na zona de Piacenza (norte de Itália), levanta a questão do que poderá haver num tal Lugar que fomente a efervescência de uma cultura de códigos e imagéticas próprias. Marcas de rituais ancestrais perpetuam naquele território, o “ Buco Della Balena” que dá ao trabalho o seu título e o seu eixo-charneira. Nada de visível nas imagens de algum modo estabelece uma relação causal com uma especificidade musical. A construção do Lugar entre o mito e o documentário, provoca uma convergência de energia entre elementos, unidos por premissas não estabelecidas à partida
Ainda na definição da força de um Lugar, o trabalho de António Bolota (AO 1962), na sua acção sobre a escala e o peso no espaço, revela uma interferência invisível sobre o espectador. O peso (ou a ausência deste) sente-se no corpo mesmo sem ter realmente uma acção directa neste. Um objecto, mesmo que imobilizado milhares de anos contém uma energia potencial, armazenada silenciosamente, que eventualmente se pode manifestar ou não.
Ryan Foerster (CA 1983), na sua prolífica produção editorial, sob um formato convencionado como fanzine, coloca sob o prisma da produção (output) uma ideia de energia geradora de sentido. Com recurso a materiais pouco polidos, o fazer torna-se equiparável ao o que fazer; uma insistência no acontecimento no real, acontecimento este provocado pelo Indivíduo segundo a sua vontade e enformado pelos códigos que lhe estão disponíveis.
Numa separação do que, em relação a uma ideia de energia, pode ou não ser qualificável, o trabalho de Ana Manso (PT 1984) entra no terreno movediço do inexplicável. Em pintura poucas coisas podem ser atribuídas a fenómenos físicos, químicos, etc. A energia que de algum modo vive nos seus trabalhos não pode ser quantificável, identificando-se antes com os fenómenos abstractos como a separação da luz das trevas, da superação sobre humana ou a crença num futuro ou passado míticos. A ficção e a imaginação conduzem a um estado de vibração cerebral electromagnética que, contudo, não tem correspondência na produção desse mesmo imaginário.
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KUBLA KHAN *
Cycle Estates–General
28.05 - 20.06.2009
António Bolota (AO 1962)
Ryan Foerster (CA 1983)
Invernomuto (2003/ IT 1982, 1983)
Ana Manso (PT 1984)
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*Kubla Khan ou “A Visão num Sonho” é um poema de Samuel Coleridge, que toma o nome do implacável imperador Chinês, por nele mencionar alguns dos seus episódios de vida. O poema escrito a jacto num sonho induzido por ópio, teria ficado para sempre inacabado por intromissão do Homem de Porlock, a figura literária do interruptor indesejado.
O conceito de energia aplicado ao contexto da exposição que se apresenta, oscila entre um elemento ponderável, físico-químico, e algo que parece fugir ao terreno do classificável (positivo) pela extensão intuitiva e/ ou metafórica que pode incluir.
Na viragem para o séc. XIX, Luigi Galvani iniciou uma série de experiências de animação de corpos animais e humanos mortos através do uso de corrente eléctrica, chegando ao conceito de energia animal: algo que anima os corpos; algo invisível mas quantificável; terreno; desligado de qualquer força exterior ao homem; em suma, nada que operasse para além do entendimento. Estas experiências de Galvanismo, além do seu impacto no imaginário literário do séc. XIX, dos quais se poderá referir o Frankenstein de Mary Shelley, podem adquirir um carácter exemplar, partindo para uma extrapolação que se pode ramificar numa abertura de sentido para dois lados: na percepção da comunidade humana como detentora de um capital energético humano, e numa simbolização da vontade.
Fará especial sentido falar de energia no contexto deste ciclo de programação. Ainda que autonomizado apenas neste último momento expositivo, a sua presença percorre todos os outros acontecimentos. Ao pensar sobre questões de produção, pensamento, acção; a energia, como uma vibração invisível, funciona como um motor de dinâmicas sociais, pensamento livre, revoluções. O seu uso metafórico consolidou-se quase como emblema da arte ocidental desde o Modernismo, exemplificando um ideal de acção, activismo, vontade.
Neste sentido, uma tradição aparentemente trivial pode servir de fio condutor a uma série de exemplos. Uma variante gastronómica de um prato absolutamente banal adquire uma possibilidade demonstrativa: a confecção do cozido das furnas nas ilhas açorianas. Ao ser cozinhado pelo calor da terra em zonas de especial actividade geotérmica, o quotidiano da comunidade evoca um enraizamento no lugar tectónico onde se está.
Tanto as tradições de uma comunidade servem de catalisador a uma série de eventos que nas suas trocas e sinergias são detentores de uma energia motriz, como a energia de um lugar na Terra provoca entres os seus habitantes, numa comunhão com o mundo, a produção de ideias e artefactos absolutamente específicos.
O colectivo italiano Invernomuto (IT, desde 2003) apresenta na exposição 'Whalesland', um trabalho que parte da subcultura black metal norueguesa, e que conta com a colaboração dos músicos John Duncan e OvO na banda-sonora. A conjugação de um filme “documental” com slides de paisagem genericamente associada à Escandinávia, mas na realidade captados na zona de Piacenza (norte de Itália), levanta a questão do que poderá haver num tal Lugar que fomente a efervescência de uma cultura de códigos e imagéticas próprias. Marcas de rituais ancestrais perpetuam naquele território, o “ Buco Della Balena” que dá ao trabalho o seu título e o seu eixo-charneira. Nada de visível nas imagens de algum modo estabelece uma relação causal com uma especificidade musical. A construção do Lugar entre o mito e o documentário, provoca uma convergência de energia entre elementos, unidos por premissas não estabelecidas à partida
Ainda na definição da força de um Lugar, o trabalho de António Bolota (AO 1962), na sua acção sobre a escala e o peso no espaço, revela uma interferência invisível sobre o espectador. O peso (ou a ausência deste) sente-se no corpo mesmo sem ter realmente uma acção directa neste. Um objecto, mesmo que imobilizado milhares de anos contém uma energia potencial, armazenada silenciosamente, que eventualmente se pode manifestar ou não.
Ryan Foerster (CA 1983), na sua prolífica produção editorial, sob um formato convencionado como fanzine, coloca sob o prisma da produção (output) uma ideia de energia geradora de sentido. Com recurso a materiais pouco polidos, o fazer torna-se equiparável ao o que fazer; uma insistência no acontecimento no real, acontecimento este provocado pelo Indivíduo segundo a sua vontade e enformado pelos códigos que lhe estão disponíveis.
Numa separação do que, em relação a uma ideia de energia, pode ou não ser qualificável, o trabalho de Ana Manso (PT 1984) entra no terreno movediço do inexplicável. Em pintura poucas coisas podem ser atribuídas a fenómenos físicos, químicos, etc. A energia que de algum modo vive nos seus trabalhos não pode ser quantificável, identificando-se antes com os fenómenos abstractos como a separação da luz das trevas, da superação sobre humana ou a crença num futuro ou passado míticos. A ficção e a imaginação conduzem a um estado de vibração cerebral electromagnética que, contudo, não tem correspondência na produção desse mesmo imaginário.
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KUBLA KHAN *
Cycle Estates–General
28.05 - 20.06.2009
António Bolota (AO 1962)
Ryan Foerster (CA 1983)
Invernomuto (2003/ IT 1982, 1983)
Ana Manso (PT 1984)
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Sister Corita Kent (US 1918-1986)
*Kubla Khan or “A Vision in a Dream: A fragment” is a poem by Samuel Coleridge that takes the name of the ruthless Chinese emperor, some of whose life episodes are mentioned. The poem was written in a stream of consciousness under the influence of an opium-induced dream, and was left forever unfinished due to the interference of the person from Porlock, the literary figure of the unwelcome interruptor.
The concept of energy, as applied to the context of the presented show oscillates between a ponderable physical-chemical element and something that seems to escape from the classifiable ground (positive) by the intuitive and/or metaphorical extension that it may include.
At the turn of the nineteenth century, Luigi Galvani initiated a series of animation experiments on the dead bodies of animals and humans by the use of electrical current. He arrived at the concept of animal energy, something that animates bodies, invisible but quantifiable; earthly, disconnected from any force exterior to man. To sum up, nothing that would operate beyond understanding. These experiments in Galvanism, besides their impact on the literary imaginary of the 19th century (of which you may refer to Mary Shelley´s Frankenstein), may acquire an exemplary character, moving to an extrapolation that results in the opening of two senses: the perception of human community as the owner of human energetic capital, and the symbolisation of will.
It would be pertinent to talk about energy in the context of this cycle. In spite of only being autonomous in this last exhibition, its presence runs alongside all the other activities. When thinking about issues of production, thought and action; energy, as an invisible vibration, works as a motor of social dynamics, freethought, revolutions. Its metaphorical use has been consolidated almost as an emblem of western art since Modernism, exemplifying an ideal of action, activism, will.
In this sense, an apparently trivial tradition can operate as a connecting thread between a series of examples. A gastronomic variant of an absolutely banal dish acquires a demonstrative possibility: the confection of cozido das furnas in the Azores, which is cooked by the heat of the earth in places of high geothermic activity. The day-to-day life of the community evokes a grounding in the tectonic site it sits upon.
The traditions of a community operate as a catalyst for a series of events that, in their trades and synergies, possess a driving force in the same way that the energy of a place on Earth causes a communion between its inhabitants in the world, resulting in the production of ideas and artefacts that are absolutely specific.
The Italian collective Invernomuto (IT, since 2003) presents 'Whalesland', a work that takes Norwegian black metal culture as its starting point, and which soundtrack features the participation of musicians John Duncan and OvO. The conjugation of a “documentary” film with slides of landscape generically associated with Scandinavia but actually shot in Piacenza (north of Italy), raises the question of what might be in such a Place that foments the effervescence of a culture with its own codes and imagetics. Traces of ancient rituals still live in this territory, the “Buco Della Balena” that grants the work its title and its axis. Nothing visible in the images establishes a causal relationship with a musical specifity. The construction of Place, in between myth and documentary, causes a convergence of energy between elements united by non-established premises.
While still trying to define the energy of a Place, the work of António Bolota (AO 1962), in its action on scale and weight in space, reveals an invisible interference with the viewer. The weight (or its absence) may be felt in the body itself without having a direct physical action. An object, even if immobilized for a thousand years, contains a potential energy stored silently, which may eventually be manifested or not.
Ryan Foerster (CA 1983), in his prolific editorial production under the conventioned format of the fanzine, puts forward an idea of energy that generates sense in the realm of production (output). Recurring to unpolished materials, doing becomes comparable to what to do, an insistence on the actual action. This action having been effected by the Individual according to his will, shaped by the codes that are available to him.
In a division between what may or may not be quantifiable, the work of Ana Manso (PT 1984), in that which concerns an idea of energy, moves into the swiftly-sinking terrain of the inexplicable. In painting, few things may be given, or attributed to physical-chemical phenomena The energy that lives in her works may not be quantifiable, identifying instead with abstract phenomena such as the separation of light from darkness, the super human overcoming or the belief in a mythical future or past. Fiction and imagination cause an electromagnetic cerebral vibration that, however, has no correspondence in the production of this same imaginary.